É sim necessário vivermos e vivenciarmos com nós mesmos e
com os outros. Porém, se já nos coubéssemos em nós mesmos e só nos
multiplicarmos em outras vidas, outras almas, seria o correto, o seguro.
O medo já fez parte dos meus dias, mas deu lugar, lugar até
bastante vasto, a vergonha. Não fiz, não vivi, não falei nada indecente,
inescrupuloso, contudo os meus pedaços doados aos outros foram, sem minha
permissão, triturados, mastigados. E então, porque a vergonha, se não fui eu? Porque quem mais poderia ter cuidado de mim,
não cuidou. Eu mesma.
Entreguei-me ao sacrifício, como cobaia a testes desumanos,
para outros humanos se satisfazerem, para se auto afirmarem e afirmarem a
terceiros o que nem eles mesmos, embora suas grandiosidades, conseguiriam ser e
construir em si.
Se “catar”. Já ouvi muito essa expressão, obviamente que em
outros sentidos, mas hoje estou tentando a duras dores e poucas forças, me
catar. Catar por aí, pelo mundo, pelos cantos zombados, por pensamentos
alheios, nas indecências, catar meus pedaços. Acredito até que não sejam mais
pedaços, e sim, fragmentos, cacos, farelos deixados por seres que se alegraram,
viveram, se amaram, se poetizaram, cantaram...com uma vida que não era deles,
até porque, para talvez precisarem agir dessa forma, eles não tenham vida. Tão somente,
diminutamente, existam no mundo, sem sequer
terem a capacidade de fazer parte dele. Mas perdoo. Perdoo por não
conseguirem ser nada além de pequenez no vazio.
Preciso caber inteiramente em mim mesma, para suportar a
vida.
Aline Frota.
Aline Frota.